Direito ao Protesto
- 1 de jun. de 2018
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O direito ao protesto encontra previsão legal na Constituição brasileira. O art. 5º, XVI da Carta Magna preceitua que: “ todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”. O direito à livre manifestação do pensamento é um dos pilares do Estado Democrático de Direito, pois materializa a liberdade e a soberania popular, uma vez que os cidadãos se unem em prol de uma pauta comum em face de atitudes governamentais. Nos ensinamentos de Robert Dahl, o protesto manifesta-se como forma de cidadania inclusiva permitindo que a voz e opinião dos cidadãos tenham influência nas decisões políticas do Estado.
Assim, nos termos da CRFB/88, desde que o protesto seja pacífico, não existem limitações jurídicas para que ele ocorra, exceto o aviso a autoridade competente e a vedação ao anonimato. Neste sentido, destaca-se que não é preciso que a autoridade competente forneça autorização para a realização do protesto, somente bastando o aviso. O que a Constituição pretende com esta normativa é conceder informações básicas para que a autoridade possa organizar o espaço para que o protesto ocorra da forma mais pacífica e republicana possível. O direito ao protesto engloba, assim, a liberdade de expressão, a livre manifestação e a liberdade de associação.
O protesto, em algumas de suas facetas, pode transformar-se em um movimento que abarca toda uma categoria, o que culmina em um movimento grevista, situação que estamos vivendo nas últimas semanas no Brasil por meio da greve dos caminhoneiros. Esta greve não deixa de ser um protesto que abarcou grande parte da referida categoria profissional. Nos termos constitucionais supracitados, uma vez que a reunião não seja violenta, a única função do Estado é fornecer condições para que os manifestantes exerçam sua liberdade de expressão.
Entretanto, o governo buscou medidas executórias e judiciais que buscam gerar o fim do movimento de protesto. O Min. Alexandre de Moraes, em sede da ADPF 519, concedeu liminar solicitada pelo governo nos seguintes termos: 1) Declarou a abusividade do movimento dos caminhoneiros; 2) Autorizou a tomada de medidas necessárias para o fim do movimento, inclusive a retirada de veículos parados no acostamento; 3) Impôs multas para os manifestantes e para os sindicatos. A referida liminar deve ser submetida ao julgamento do Plenário do Supremo.
Porém, pelo suporte da decisão, Michel Temer editou o Decreto nº 9382/2018 que permite o emprego das Forças Armadas para a Garantia da Lei e da Ordem (operações GLO) para desobstrução de vias públicas. Lembrando que, ano passado, Temer editou o Decreto de 24 de maio de 2017 autorizando operações GLO no Distrito Federal por conta das manifestações que estavam acontecendo naquele momento. Todavia, logo após, por conta da repercussão negativa, revogou o referido decreto.
No movimento dos caminhoneiros, de plano, não é possível visualizar nenhum tipo de violência produzido pela categoria que sustente intervenção dos Poderes Executivo e Judiciário. Os caminhoneiros apenas pararam. Se reuniram em um lugar e pararam seus veículos. Não existe abuso nos termos do direito de reunião do art. 5º, XVI da Constituição. A única categoria impossibilitada de fazer greve de protesto é a militar conforme o art. 142, IV da CRFB/88. Os atos dos caminhoneiros, que foram replicados por grande parte da categoria, estão em consonância com os dispositivos constitucionais. O abuso se configura por parte dos Poderes que buscam impor critérios inconstitucionais para limitar o exercício dos direitos greve e reunião e gerar o fim de uma manifestação legítima.
Aqui, é importante ressaltar que, independentemente das opiniões pessoais, a utilização constante por parte do governo - referendado pelo Judiciário - das Forças Armadas para conter protestos legítimos é um grave problema para um Estado Democrático de Direito. É claro que quando se trata de direitos fundamentais nada é absoluto, portanto, a situação abarca o debate entre o limite de direito de manifestação, tema que por si só é polêmico e, inclusive, gera grande discussão no STF que tem dois casos de repercussão geral pendentes de julgamento sobre a temática. Mas, qualquer situação que viole o núcleo essencial de um direito fundamental deve ser vista com muito cuidado e atenção pela sociedade. para avaliar aspectos o movimento dos caminhoneiros influencia todo o abastecimento nacional, todavia, não é por meio de práticas estatais inconstitucionais que o movimento chegará ao fim. O governo tem outros meios legais, legítimos e constitucionais para negociar com qualquer categoria e, inclusive, sua função é garantir a estabilidade do Estado. Não podemos coadunar com a utilização de manobras políticas que buscam subverter os preceitos constitucionais.
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